AI, a consequência das nossas escolhas AKA chorar pelo leite derramado

Nos próximos dois, três anos a utilização da Inteligência Artificial nas nossas vidas irá aumentar drasticamente. Não sou da opinião que iremos ficar à mercê dos robots, mas aproximam-se mudanças radicais consequentes também das nossas parcas escolhas.

Do hiper complexo advento da IA e dos data center que permitem o exercício das suas funções computacionais dou apenas um exemplo: a energia necessária para a refrigeração dos referidos centros. Uma coisa os humanos teem em comum com os computadores, nenhum dos dois funciona a altas temperaturas. Paradoxalmente um dos desafios da IA será diminuir o impacto do aquecimento global no Planeta, consumindo para isso pelo menos seis vez mais energia que os computadores de operações comuns que não utilizam inteligência artificial.

Mas a IA é o irrevogável bem de consumo pelo qual sempre ambicionamos. Estamos sedentos que as máquinas encontrem soluções para problemas que nunca tentámos, nem quisemos resolver.

Conseguimos criar um instrumento que irá tornar obsoleta e, por conseguinte, supérflua a nossa criatividade. Mas a escolha do pensamento acrítico vem de longe, foi nossa e foi feita no máximo exercício das nossas capacidades.

A IA acelerou um inevitável mas auto imposto declínio da criatividade humana

Há, pelo menos, duas décadas que a intervenção jornalística tornou-se uma anedota de mau gosto. Os apresentadores de telejornais são escolhidos basicamente pelos seus visuais e não pelas suas capacidades profissionais, salvo raríssimas excepções. A informação é mal escrita, não somente no seu conteúdo informativo, mas sobretudo na soberba gramatical. Repetem-se lugares-comuns nas entrevistas com um rol de perguntas flácidas e estéreis. A informação abriu mão do poder inerente para se vergar aos poderes adquiridos.

A escrita de argumentos cinematográficos já é melhorada e revista com a IA, descartando os dias, as semanas em que argumentistas, realizadores e produtores moldavam estórias ao sabor das suas realidades. O “writers’ room” tá vazio e segue-se o camarim dos artistas.

Os designers estão a pagar pelos seus pecados há já um tempo e os tradutores, esses párias, são uma espécie em extinção.

Facto é que o trabalho criativo deixou de ser trabalho há muito tempo. As funções profissionais dissolveram-se num folclore de mau gosto em que o jornalista tem de ser modelo, influencer e bully; o escritor tem de ser stand-up comedian e podcaster; o designer criativo tem de ser arquitecto de interiores, técnico informático e especialista nos módulos do IRS.

A perícia deu lugar a antros de propaganda política, opiniões bacocas de almas vendidas por meia dúzia de tostões, com a presunção do Rei que se pavoneia pelas ruas, nu.

Aceitámos baixar as nossas compensações monetárias, porque o mercado nos estava a dar uma “grande oportunidade de carreira”, aceitámos ser porta-microfones no meio de arenas de leões sem impôr condições, permitimos que media e entretenimento formassem uma única realidade sem respeito por quem no passado lutou pelos seus códigos de ética. Estamos prontos para o Museu de História Natural, secção civilizações antigas.

Alambazámo-nos de arrogância e agora vemos o fecho de jornais, canais de televisão e rádios. Arte substituída por fillers e botox. A realidade em directo dos social media e a sua força popular, até populista, foi o penúltimo prego no caixão. A IA é o último.

Somos dispensáveis porque decidimos não pensar pelas nossas cabeças e, sobretudo, ignorámos ajudar a educar a voz crítica de quem nos poderia salvar: o público.

Apesar do panorama parecer profundamente catastrófico eu sei que há gente de grande valor a remar na direcção de novas marés. A IA irá promover grandes mudanças mas também grandes oportunidades, sendo a mais importante de todas o estreitar do vínculo das relações interpessoais. Pensemos mais rápido e melhor com a ajuda da IA mas não deixemos de pensar, porque a realidade continua a necessitar que os humanos continuem a colocar questões pertinentes e a conferir respostas valiosas.

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